A Noite da Facada – 03/09/2025

Relato da Tia Andréa 

03h00 – Porto Alegre / Farroupilha

Everton me acordou por volta das três da manhã dizendo que havia algo errado. O André estava ligando porque o Gustavo tinha sido assaltado e levado uma facada, sendo encaminhado ao HPS.

Na saída do estacionamento com o carro, nos deparamos com um acidente de trânsito em que um veículo havia capotado na Av. João Pessoa. Chovia muito e, aflitos pela situação, acabamos não parando o carro.

03h30 – Porto Alegre / Bom Fim – HPS

Ao chegar no hospital, perguntei pelo paciente Gustavo. Uma moça, que se apresentou como Brenda, aos prantos, contou que estava com ele no momento do assalto. Disse que estavam na escadaria da Borges de Medeiros, onde mora, aguardando o carro de aplicativo, quando foram abordados por um assaltante armado com faca. O criminoso exigiu o celular, mas diante da resistência do Gustavo houve luta corporal, e ele acabou sendo atingido com uma facada no peito.

Brenda, muito nervosa e chorando, apavorada.

Em seguida, liguei para Fabiano, pai do Gustavo, pedindo que fosse ao HPS e explicando a situação. Pouco tempo depois, fui chamada para vê-lo. Ele já estava mais tranquilo e medicado, embora sonolento e com episódios de falta de ar. A facada atingiu o peito do lado direito, perfurando o pulmão, e foi necessário colocar um dreno.

Logo depois, Fabiano chegou e abraçou o filho. Sob efeito dos medicamentos, Gustavo estranhou a presença do pai. Ficou me olhando de forma estranha. Então, por um instante, tomou consciência do que estava acontecendo e começou a chorar, pedindo desculpas pela preocupação que estava causando. Nesse momento, deixei os dois sozinhos e pedi à enfermeira que permitisse a entrada de Brenda por alguns minutos, para que também pudesse se acalmar.

Na saída do hospital já estávamos mais calmos. Nos despedimos, trocamos contatos e fomos de volta a nossas casas.

Os dias que se seguiram foram um misto de emoções e uma sensação de vulnerabilidade, de desproteção a que estamos expostos. Ainda por alguns dias e algumas noites fiquei com a cabeça agitada, sem conseguir parar de pensar no que tinha ocorrido, com o coração acelerado.

No dia seguinte, desmarquei a festa do meu aniversário, que havíamos combinado de celebrar em um bar com a familia. Restava a tarefa mais difícil: contar aos meus pais o que havia acontecido com o neto.

Mais uma vez, me surpreendi com a força deles. São como uma rocha: firmes e objetivos. A mãe, como sempre, buscou uma culpada — excomungou a menina, porque nunca admite falhas nos seus lindos e maravilhosos netos. O pai, por sua vez, pensou de forma objetiva e prática, encarando a situação de frente.

Nos dias seguintes, a rotina foi retomando seu curso, mas a lembrança daquela madrugada permaneceu viva. A violência, o medo e a fragilidade da vida ficaram marcados em cada detalhe: no choro de Brenda, no olhar assustado do Gustavo, no abraço firme do Fabiano e até no silêncio pesado da sala vermelha do HPS.

Percebi que não estamos preparados para nos sentirmos vulneraveis, e que a vida pode mudar em segundos, sem aviso. Entre lágrimas, susto e alívio, restou a certeza de que, apesar da dor, ainda havia motivos para agradecer: o Gustavo estava vivo.

Encerramos aquela semana com mais cautela, mais união e com a sensação de que, mesmo em meio ao medo, é possível encontrar força — seja na família, seja na fé ou simplesmente no ato de estar presente um pelo outro.

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